Sunday, 7 November 2010

Too late...

Estás num bar onde todos conhecem-te, encostada ao balcão na tua, a curtir o teu som. Dás-te conta que há "sangue novo" no território e, de longe, observas os forasteiros.

Um deles apresenta-se: "Hey, sou o Jorge. Posso pagar-te um copo?".

Tu, receosa como sempre, não aceitas a primeira, mas depois de muita conversa ele convence-te a aceitar, afinal, um copo não faz mal a ninguém. Começas a beber e continuas a falar com o tal rapaz, sentes-te cada vez mais a vontade e nem dás conta de que o tempo está a passar. Ele paga-te outro copo, e mais outro e nem te apercebes de que estás a ficar cada vez mais vulnerável. Por volta da hora de fecho do bar, dás por ti tonta, sem reacção, completamente drograda. O moço, na sua boa fé, oferece-se para levar-te a casa. Tu, sem sequer pensar no assunto, aceitas. Afinal, o que tem de mal? Ele até parece boa pessoa!

Entretanto, adormeces no carro... Quando acordas, vês que estás numa rua do Bairro Alto, sem noção do tempo, sozinha. Pensas para ti: que estou a fazer aqui? Aquele monte de merda enganou-me bem. Ouves passos, mas não tens força nem controlo sobre ti para sequer virares a cara para ver quem vem lá.

De repente a pessoa aproxima-se de ti e senta-se ao teu lado. Só tens força para abrir os olhos e pouco mais. Ouves, como um suspiro ao teu lado:

"Olá criatura. Que decadência a tua, ao fim destes anos todos observei-te de perto sem que desses por mim. Segui os teus passos. Vivi na sombra do teu ser. Para que? Para poder estar presente quando o momento certo chegasse. E hoje o grande dia chegou. Gostaste do meu amigo Jorge? Ele é um porreiro. E sabes da ultima novidade? Trabalho na disco onde estiveste. No bar mais concretamente. Estás com mau aspecto. Bebeste demais? Ou então foi daquele pozinho branco que deixei cair, inocentemente, em todos os copos que bebeste? Ooops... My fault... Sabes, hoje quero mostrar-te algo, quero mostrar-te que aprendi contigo o sentido mais puro do sentimento que nutri por ti durante todo este tempo. "A vingança tarda, mas não falha". E é isto. Tardou mas cá estamos, tu drogada e bêbada no meio de um beco e eu lúcida, mas cega de ódio. Hoje será a ultima vez que terás coragem para ser quem foste, porque garanto-te não voltarás a ser a mesma criatura que foste em tempos. Sabes o que tenho aqui? Um brinquedo para ti. Uma razorblade. Deixa-me ajudar-te, sei que tens sofrido muito e tenho a perfeita noção de que queres por um ponto final nesta tua vidinha miserável. Eu ajudo-te, afinal os amigos são para as ocasiões, right? (...) Ooops... Acho que foi muito fundo, o jacto de sangue fez ali uma bela pintura na parede hum?? Deixa cá ver o outro braço agora. (...) Ooops... Acho que exagerei neste também! Enfim. Deixa lá. Não deves sentir muita coisa neste instante. Enfim, está na minha hora! O Jorge está a minha espera no carro. Vemo-nos por aí, ou deverei dizer, vejo-te no inferno?"

Não consegues acreditar no que te está a acontecer. Vês o teu sangue por todo o lado e mal te lembras da pessoa que te fez isto. Tentas poupar os teus últimos suspiros no caso de alguém aparecer para te ajudar. Começas a pensar no que deixaste para trás, no que foste e no que fizeste. Aquela voz não te era estranha. Era-te muito familiar mesmo. Num flash de memória, nos poucos minutos que te restam, a imagem de duas miúdas, duas amigas, ou talvez, mais que isso, aparecem-te de repente na cabeça. Era ela! A tal que juraste fazer a vida num inferno. Olhas para ti mesma, nesse estado, a esvairar-te em sangue, sem ninguém por perto, sem fôlego nenhum.

Chegou a tua hora, pagaste pelos teus actos. Resta-te um último suspiro e dás por ti mesma a dizer... Desculpa.

Mas infelizmente, era tarde demais.

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